O mestre não quer matar os personagens dos jogadores, mas ele interpreta monstros que querem, e vai dar o seu pior nessa empreitada. Vamos conhecer quais os papéis do mestre e dos jogadores, em Oil Fantasy?
Você já teve um mestre tão, mas tão controlador, que temia a qualquer momento que um raio caísse, do nada, na sua cabeça, porque você desafiou seu NPC queridinho?
Ou já sentiu que suas decisões não importavam porque qualquer ação significativa que não agradasse os planos do mestre para a sessão eram um tiro n'água?
Relação lúdica saudável
Quando
você decide atacar os exércitos azuis em desvantagem, na proporção de 2 contra 3 no WAR,
você sabe muito bem o risco que está correndo. Se você topou o risco, é
porque provavelmente calculou o ganho possível e pensou: é bem capaz deu me
dar mal, mas se o destino sorrir para mim, ficarei muito próximo de
ganhar o jogo.
Só
é possível fruir de um jogo, em sua plenitude, com o conhecimento de seu
funcionamento. Jogar na ignorância significa tomar decisões
inconscientes, levando a interações sem significado.
Talvez RPGs - Roleplaying Games (ou JIPs - Jogos de Interpretação de Papéis, para os Policarpos de plantão), não sejam somente sobre interpretar papéis no faz de conta, mas também fora dele.
Em jogos, de forma geral, entender o que cabe a cada jogador é fundamental. Quando todos os jogadores têm as mesmas atribuições, como numa partida de WAR, seus papéis são simétricos. Quando há diferenças, chamamos de papéis assimétricos, como no futebol.
O problema do D&D
O RPG nasceu como um jogo de papéis bem assimétricos: mestre e demais jogadores. Desenhar bem o papel de cada um destes participantes é importante por vários motivos. Um deles é que todos os participantes entendam o funcionamento do jogo que estão jogando, porque isso permite decisões mais conscientes dos riscos e impactos assumidos, levando a interações lúdicas mais saudáveis, cheias de significado.
O que acontece no D&D, do clássico aos dias de hoje, é que o papel do mestre é ao mesmo tempo muito amplo, lacunar e mal desenhado. O normal é assumir que os jogadores tomam conta dos seus personagens e todo o resto cabe a ele. Todo o resto o que, exatamente?
Outros jogos ao longo das décadas atacaram esse problema, ora criando limitações mecânicas à atuação do mestre - como no Apocalypse World, no qual apenas os jogadores jogam dados, ora eliminando completamente seu papel. Porém, algo se perde nesse processo.
Nossa proposta
Não há como medir o gigantesco volume de dicas de mestre que são produzidas todos os dias nas comunidades de RPG, de todas as naturezas. Tais esforços tentam, em maior ou menor grau, entender como evitar as relações lúdicas pouco sadias que a figura do mestre provoca em jogos que não cuidaram de seu papel mecanicamente.
Algumas delas são pura perda de tempo e reforçam os problemas, outras realmente funcionam, mas não é incomum vermos a mesma pessoa dando dicas contraditórias entre si ou que parecem pouco testadas fora do âmbito pessoal de seu próprio grupo. Você ficaria surpreso com a quantidade de produtores de conteúdo e até mesmo game designers que não jogam, não experimentam nem testam nada fora de sua zona de conforto.
A proposta do Oil Fantasy é de estilo, e fica em um lugar entre o game design e as práticas de mesa, porque tentamos estruturar uma visão do jogo clássico, a partir das mesmas críticas que levaram jogos mais modernos a bloquear ou eliminar o mestre, mas dando outras soluções, apontando outros caminhos, sistematizando práticas de mesa, trabalhando eles em uma proposta bem amarrada, para que o jogo se imprima de baixo para cima, de cada grupo até os produtos do game design, de maneira artesanal.
E para começar, vamos delimitar aqui o papel de cada partipante, tendo em mente o que abordamos anteriormente: o jogo Oil Fantasy é focado na construção e superação de desafios.
O mestre (DM) atua como desafiante.
Cabe a ele, ao propor o desafio:
- Controlar o mundo de aventuras
- Controlar os personagens não-jogadores (NPCs)
- Fazer a interface dos jogadores com o mundo através de descrições
- Gerir o uso e negociação das ferramentas do jogo (arbitragem)
Os jogadores atuam como desafiados.
Cabe a cada jogador, ao tentar superar desafios:
- Acionar as descrições do DM mediante perguntas relativas ao espaço sensorial de seus personagens no mundo de aventuras
- Negociar com o DM a aplicação das regras do jogo
- Decidir as ações de seus personagens
- Gerir os riscos aos quais seus personagens se expõem
Desafiar é o que delineia os poderes do DM; peitar - ou não - o desafio, com seus personagens, é o que desenha a atuação dos jogadores. Haverá sempre espaços comuns a ambos no caos do jogo, mas isso fica mais pra frente.
Definir bem os papéis permite que cada lado dessa relação assimétrica se aprofunde em suas atividades e traga perspectivas exclusivas que se encontrarão no diálogo criativo, onde a magia acontece.
Por enquanto, é legal entender que o DM, enquanto perseguir algumas diretrizes objetivas do que é um bom desafio, terá total carta branca pra atuar em seu papel, dando seu pior para desafiar os jogadores que, por sua vez, devem fazer o seu melhor para domarem os riscos e superar os perigos propostos.
Ao passo que vai parecer que vamos moldar o DM em seu papel clásssico - e vamos mesmo - mas você vai ver que é libertador saber quando o exercício de sua arbitrariedade é necessária e saudável ao jogo, e quando não é. Isso é absolver o mestre e fazê-lo funcionar a favor de uma relação lúdica sudável, entregando algo que não consegue com jogos que o limitam demais.
Animado com o progresso do blog e feliz de ver as ideias que cultivamos em mesa moldarem um playstyle tão recompensador boraaa
ResponderExcluirA comunidade vinha empolgada, pedindo algum material pra ler sobre oil fantasy. Espero conseguir transmitir em palavras tantas ideias legais que surgiram durante os testes com vcs.
ResponderExcluirBalbi, achei similar ao descrito naquele livro Arbiter of Worlds, do Macri. Foi inspirado?
ResponderExcluirCara, não conheço esse livro nem o autor, mas se você achou parecido vou dar uma olhada!
ExcluirOpa Marcelão, agora li o Arbiter of Worlds. Eu conhecia o trabalho do autor no ACK, mas nunca tinha lido nada dele fora esse core book.
ExcluirSobre o livro em si, há pontos em que nos aproximamos sim, mas em outros não. O jeito dele ver regras, rulings e o papel do mestre são bem próximas às minhas, principalmente. Ele tem um background jurídico que nem eu, achei curiosas algumas leituras.
No aspecto diversão, concordo demais com ele, mas desenhamos o papel do mestre de forma distinta. A provocação aparentemente foi a mesma (talvez o Raggi) mas as soluções diferentes.
Um abraço e obrigado pela indicação! =)
Interessante a discussão levantada de papéis. Estava discutindo com um xará em um grupo que defendia que o mestre deveria podar a agência dos jogadores em prol de construir uma boa narrativa. Questionei: narrativa boa pra quem?
ResponderExcluirExatamente, cara! Se o jogo é de contar histórias e não tem um sistema que gamifique as vontades criativas mas, ao contrário, coloca muitos poderes na mão do mestre, acaba que vira um jogo de agradar as vontades criativas dele em chegar à narrativa idealizada, que não necessariamente a ideal para todos. E agora, além da responsabilidade de guiar uma construção de narrativa guiada com seus jogadores, agora o mestre tem a função de entreter jogadores que dificilmente terão agência para engajarem com o jogo de forma satisfatória.
ExcluirMuito louco né? rs
Quando vi que o Quiral ia bater papo sobre um blogue que não tinha assinado, interrompi a reprodução do vídeo e vim aqui. Na qualidade de 'Policarpo de Plantão', me vejo obrigado a perguntar, por que não Fantasia Oleosa?😁
ResponderExcluirDepois comento mais. Até.
Porque não somos Policarpos de plantão. Um abraço!
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