O mestre de Oil Fantasy, como vimos, tem uma função principal: tecer o melhor desafio para o grupo. Tudo que não faz parte dessa atuação, deve ter o controle ficcional compartilhado com os demais participantes. Neste ponto, a assimetria de papéis entre o desafiante e os desafiados cessa. Vamos entender melhor essa mudança de postura?
O trabalho do mestre, focado em construir o melhor desafio, permite que o jogo seja pautado, de forma geral, nas decisões dos jogadores: eles têm o controle narrativo através de seus personagens, conforme fazem uma gestão ativa de riscos que pauta a atuação do mestre de Oil Fantasy.
Para propor o melhor desafio, o mestre controla o cenário e sobre os NPCs, além de fazer a interface entre o mundo ficcional e os jogadores, e conduzir arbitragens. Porém, quando o jogo não estiver tracionado pelo mestre atuando como desafiador, não há porque imprimir este tipo de controle sobre a ficção, nem se justifica a assimetria de papéis.
Surfin’ Bird
O papel do mestre, portanto, passa a se especializar neste sentido e se minimiza perante o papel clássico do DM old school. Ele passa a compartilhar o controle ficcional e bater bola com os demais participantes de forma bastante livre e solta, à espera de momentum para voltar à sua atividade de executar novamente o melhor desafio, a partir dos elementos trazidos por todos ao jogo.
É como um surfista que rema ao sabor do mar e permanece passivo perante as flutuações das marolas, esperando a melhor oportunidade para, ativamente, realizar sua explosão muscular e surfar a onda.
Esse momento só ocorre quando ele tem elementos à mesa suficientes para construir novamente um bom desafio, de acordo com tudo que já vimos aqui no blog, tanto em suas restrições atreladas à agência dos jogadores, quanto de seus requisitos formais.
D&D Moleque
Aventura de muitos experimentos, a primeira temporada de D&D Moleque explorou essas diferentes posturas do mestre em suas primeiras iterações. Em um primeiro momento, o desafio que tracionava o jogo era a exploração da dungeon proposta na clássica aventura Lost City e, neste contexto, o mestre controlou o mundo de aventuras e os NPCs.
Em dado momento, porém, o grupo resolve sair da dungeon para poder investir os tesouros já encontrados em alguma cidade, de forma a se prepararem melhor, comprando mais equipamento de exploração. Quando isto ocorreu, a aventura perdeu sua tração de desafio e a postura do mestre mudou.
Em vez de continuar criando ativamente o mundo de aventuras e dos NPCs, passou a perguntar também aos jogadores sobre o que acontece, buscando que tragam ao jogo elementos ficcionais que o permita novamente construir um desafio que tracione o jogo.
Criação Coletiva
Essa postura equilibra o peso das vontades criativas em jogo em relação ao RPG Old School tradicional. O mestre encontra nesta dinâmica um gabarito de atuação mais objetivo, que o ajuda a focar em um papel específico no jogo, conforme abre espaço e controle narrativo aos demais jogadores da mesa quando não estiver no exercício de sua função primordial.
Proposição interessante. Segue meus dois dedos de pitaco da brisa!! ✌
ResponderExcluirCompartilhar a criação do mundo ficcional é algo muito bacana. Me lembra bastante o método de jogo proposto pelo Dungeon World onde o worldbuilding começa numa página em branco junto com a participação do grupo durante o jogo jogado e não nas anotações mestre no seu momento de prep.
No Dungeon World, a lógica de Movimentos ajuda bastante na criação do desafio ao trazer peças e mais peças para a ficção. Porém, no old School, não há essa "impulsão narrativa" que é dada pelos movimentos do PbtA. Nela criação do mundo ficcional está intrinsicamente ligada ao desafio e, mesmo que os jogadores possam dar inputs à depender da abertura concedida pelo DM, isso nunca constituirá a grande massa do mundo ficcional.
Vi o exemplo do D&D Moleque e achei bem interessante. Não sei se o que houve foi bem uma assimetria nos papéis do DM e de Jogador (apesar dessa diferença ser de fato bem atenuadas nesse momento do rolê). Acho que para haver assimetria verdadeira entre DM e Jogador, em algum momento do jogo, os papéis precisariam ser de fatos trocados onde o DM assume o papel de um PC e um jogador assume o papel de DM (não que eu prefira assim). Sem o motor de XP (jogar com um PC), sem a oportunidade pesar Risco X Recompensa e com um mundo inteiro a disposição, acho que o DM sempre vai estar numa posição diferente do restante do grupo. Mas, no frigir dos ovos, é bem salutar esse atenuamento momentâneo nas diferenças de papéis proposto pela Surfada Oil Fantasy 🏄🏄🏄.
Parabéns a você Balbi e ao pessoal do Café por compartilhar essas propostas e reflexões muito maneiras e produtivas para a comunidade! 😁👍
Fala Rogério! O Dungeon World traz mecâncias muito voltadas à agenda narrativista e nesse ponto os desafios criados se prestam prioritariamente a impulsos narrativos, como você bem colocou, mas não é o caso na proposta Oil Fantasy.
ExcluirSeguimos por um caminho de simulação que ora é tocada pelo mestre, quando há tração no desafio que propõe, ora é tocada pelo grupo todo, mestre incluso, quando não há desafio.
A simetria ela ocorre no contexto do desafio: nesse ponto o mestre é desafiador e os jogadores desafiados, o primeiro especializado na função de construir e arbitrar o desafio, os últimos na função de reagir conforme através de seus personagens na resolução dos problemas apresentados na ficção, com ênfase no "como".
Quando o desafio não é tracionado, essa assimetria é eliminada porque não há motivos para o mestre ter exclusividade de criação ficcional sobre o cenário e NPCs. O jogo se torna horizontal até que haja elementos na mesa suficientes pra que o desafio seja novamente tracionado.
Essa assimetria é funcional, orientada ao desafio. Quando acontece a assimetria, todos estão em pé de igualdade em seus poderes criativos à mesa, em um diálogo solto no qual não há motivos para o mestre exercer controle exclusivo sobre nenhum aspecto.
Ainda estamos explorando esse momento simétrico. Essa assimetria se baseia no seguinte: quando não há desafio tracionado, tanto mestre quanto jogadores possuem o mesmo vetor criativo, apontando na mesma direção, que é gerar ficção.
Concordo com você que os jogadores continuam investidos das agendas de seus personagens e o mestre de forma geral atua com uma agenda de facilitador, mas o fato é que ambos, neste momento, caminham na mesma direção e dividem basicamente dos mesmos poderes e ferramentas de jogo, daí a simetria proposta.
Grande abraço e obrigado pelas reflexões!