Oil Fantasy Reflexões #07 - Destrinchando o desafio

Continuamos com mais uma reflexão Oil Fantasy!

Abordamos ao longo deste blog, por diversas vezes, o desafio e formas de solução: amplitude de soluções, soluções inadequadas e absurdas.

Vamos tentar amarrar alguns dos principais pontos do Oil Fantasy: a construção do desafio, a negociação e a arbitragem no contexto do D&D clássico.

Ao tratar de uma situação no jogo que ofereça risco, é natural que os jogadores tentem minimizá-lo ou eliminá-lo por meio de ações. Para julgar se essa ação é adequada, utilizamos o conhecimento comum da mesa sobre o funcionamento do mundo - a verossimilhança, junto com os parâmetros e ferramentas de jogo. 

Algumas vezes a ação declarada é adequada para contornar o problema, o risco é eliminado e a situação resolvida. Outras vezes a ação é adequada, mas não elimina completamente o risco e neste momento entramos num diálogo sobre consequências dessas ações de maneira a ancorá-las na ficção. Este momento da conversa chamamos de negociação.

Eu já fui questionado algumas vezes quais eram os fatores que deveriam influenciar uma determinada situação pela ótica do Oil Fantasy e, em geral, a resposta é que cada situação informa quais são seus elementos relevantes. Essa resposta abstrata faz com que, mesmo um observador menos atento, perceba que mesas diferentes julgarão de forma ligeiramente diferente quais são esses fatores. E é através da negociação que a mesa chega num consenso e percebe o que é relevante. 

 

 

 

 

Destrinchando o Desafio

Vamos analisar juntos um exemplo:

Um grupo de aventureiros (dois guerreiros e um ladrão) acabam de sair de um templo no coração da floresta, carregados de tesouros. Eles estão fugindo dos ocupantes desse templo, uma tribo de homens-macaco, cujos berros ficam cada vez mais próximos, e se deparam com um desfiladeiro muito íngreme. 

Eles tentam a sorte, contornando o desfiladeiro seguindo o sul, por onde encontram uma velha ponte de cordas e madeira em condições precárias, com algumas tábuas parcialmente quebradas, por vezes intercaladas por tábuas faltantes presas por cordas que parecem ter trechos de espessura variável.

Aqui está estabelecido o desafio da travessia uma ponte em pésismas condições, com fatores complicadores como a possibilidade de queda, a urgência de serem alcançando pelos homens macacos, e o excesso de peso decorrentes de suas armaduras e do tesouro que carregam.

 

Informando os Jogadores

A distância entre os perseguidores e o grupo deve estar pelo menos ventilando a cabeça dos jogadores. pelo risco de serem alcançados.

O quanto de peso uma corda em condições normais suporta aparece nos manuais (no Caves & Hexes cerca de 3 humanos médios) e abre espaço para negociação baseado nas condições da ponte e nas formas de travessia do grupo, baseado no risco da ponte romper.

O comprimento da ponte não foi devidamente informado, mas cabe aos jogadores engajarem com o mestre em busca de mais informações e estabelecerem um parâmetro de tempo para a travessia, por exemplo.

Caso busquem tais informações, o mestre deve responder a suas indagações, estabelecendo noções de tempo ou comprimento para travessia, e também ressaltar como em algumas partes a corda está "mais fina, como se estivesse desfiando", caso os jogadores perdessem mais tempo analisando a ficção a respeito de como as poucas tábuas concentrariam esse peso nessas regiões mais desgastadas das cordas.

 

Transparência e agência preservada

 O mestre deve apresentar as informações fazendo uma interface entre a ficção e as mecânicas do jogo para esclarecer alguns dos parâmetros do desafio.

Falar das condições das tábuas provavelmente informa uma piora na categoria de deslocamento. Os jogadores devem entender o que isso significa, caso necessário as regras de deslocamento devem ser elucidadas. Isto abre espaço para os jogadores assumirem riscos de transpor a ponte com mais velocidade e risco de queda, ou um deslocamento cauteloso com risco de enfrentamento dos perseguidores.



Negociação e arbitragem 

Não existem, no D&D clássico, regras para risco de queda ao correr por uma ponte em condições ruins. Por esse motivo a interface da ficção com a mecânica deve acontecer novamente. No Caves & Hexes  utilizamos uma regra para escaladas aonde o peso carregado pelo personagem se relaciona com a chance dele cair, ocorrendo queda na ocorrência de resultado 1 ou 2 numa cadeia de dados  - d4, d6, d8, etc - que diminui de acordo com a categoria de peso. Apesar de não ser uma escalada, essa regra, a mim, parece um bom parâmetro para arbitragem, então é exposto que os personagens apresentam um risco ao atravessar essa ponte semelhante ao risco de uma escalada e ainda é possível negociar que, caso eles atravessem correndo, esse risco seja maior (1,2 e 3 no dado adequado). Aqui abrem-se as portas da negociação e os jogadores podem propor que o risco é menor numa ponte do que numa escalada (1 no dado adequado) ou se forem com cuidado demoram mais tempo e não tem risco de queda. Podem negociar passos nas categorias de peso. 

 

Considerações


  • Parâmetros de tempo

Algumas ações cabem no período de a rodada outras cabem no período de um turno e, numa perseguição, o tempo importa! Mesmo outras medidas poderiam ser adotadas como o tempo de Hexploração.


  • Parâmetros de rompimento das cordas

    Suponhamos que a tal ponte suporte menos do que uma corda comum (está bastante desgastada então deve suportar menos do que o padrão), portanto a travessia simultânea apresentará riscos, assim como atravessar com equipamentos pesados nas costas.

  • Perseguição

    Para cada período de atividade dos personagens, há um período de atividade igual por parte dos perseguidores. Isso gera uma sensação de urgência e a possibilidade de algo ou alguém ser deixado para trás.

  • Travessia

    O modo de atravessar a ponte provavelmente interferirá no desfecho. Correr de maneira descuidada deve abrir possibilidade de queda, tanto pelas tábuas em condições ruins quanto pela possibilidade de concentrar peso em partes fragilizadas da ponte prestes a se romper. Atravessarem os personagens um a um provavelmente deixará alguém à mercê dos homens-macaco, assim como atravessar de maneira demasiadamente cuidadosa poderia expô-los todos a serem alvejados pelas rústicas lanças dos perseguidores. Retirar armaduras e separar equipamentos em sacos, mochilas e outros containers toma tempo, e encarar um encontro sem armas ou armaduras é um grande risco. O desafio testará como os jogadores administram seu tempo e seus recursos, assim como quais riscos eles estão dispostos a enfrentar.

  • Agência
O desafio está exposto, os jogadores tem a liberdade de fazer o que quiserem e devem arcar com as consequências. Inclusive esteja preparado para eles acharem outra solução que não seja atravessar a ponte.

 

 

Resolução

Caso as ações propostas pelos jogadores não estejam previstas no conjunto de regras utilizaremos parâmetros do mundo ficcional e das ferramentas existentes para negociar as possíveis chances e consequências. Vamos abordar a negociação e arbitragem numa próxima reflexão. Quem sabe uma boa distração não despiste esses homens-macacos e um exemplo melhor apareça.

E aí o que vocês levariam em conta nesse desafio?

 




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