Oil Fantasy Reflexões #08 - Negociação e Arbitragem pt.3 - Consagrado


Aqui estamos mais uma vez para abordarmos mais exemplos pela ótica Oil Fantasy!

Vocês já devem ter ouvido por aí de alguém que queria jogar com um personagem que não estava contemplado no conjunto de regras, tipo um anão que soltasse magias, não ouviram? A resposta é que isso pode acontecer dentro do jogo, sim. Mas como? 

Seguiremos com um exemplo que quebra a estrutura tradicional das classes, mostrando como tudo no jogo pode ser encarado como ferramenta, servindo apenas como parâmetro para arbitragens.

Nesse exemplo usamos como base as ferramentas do jogo Caves and Hexes (C&H), baseado em D&D Basic/Expert (1981).




Pedro, o Consagrado

Caio, o Consagrado (clérigo de 2º nível), e Pedro, o Leal (guerreiro de 2º nível), eram como irmãos de armas e de fé, e andavam de cidade em cidade pregando a palavra de seu Deus, espantando demônios e assombrações que importunavam os vilarejos.

Desceram ao nível mais baixo do mausoléu, aonde enfrentaram alguns mortos-vivos. Apesar de serem aventureiros temperados, o cansaço anuviou suas escolhas e eles continuaram descendo mesmo com poucos recursos e feridos.

No nível inferior foram surpreendidos por um grupo de esqueletos, o que representou um grande desafio, que terminou ferindo os dois aventureiros e colocando um fim na aventura do clérigo. Nessa hora, bateu um desespero no jogador que controlava Pedro, e seu personagem está cercado por pilhas de ossos ambulantes, sem grandes perspectivas.

Nesse momento ele pensa numa única salvação: pegar o símbolo sagrado de seu querido amigo e recorrer ao deus pelo qual ele dedicou sua vida! Nesse momento, tenta com toda sua concentração expulsar os mortos-vivos com um clamor de fé.


Habilidades de classes, movimentação, salvaguarda, características físicas dos personagens, tudo pode servir como parâmetro!


[Ferramenta] Existe uma ferramenta própria para isso, as regras de Expulsar Mortos-Vivos, que consiste na rolagem de 2d6 para determinar se houve sucesso na expulsão, o que é regulado por uma tabela que compara o nível do clérigo e o número de Dados de Vida do morto-vivo. No caso de sucesso, outros 2d6 são rolados para determinar o número de dados de vida atingidos e o estrago.

[Negociação] Num primeiro momento, o mestre diz que o Expulsar mortos-vivos é uma habilidade exclusiva dos clérigos e que ela não pode ser replicada por um guerreiro. O Jogador explica que ele não é um guerreiro qualquer, ele sempre se dedicou a esse deus, espalhando suas palavras e engajando em missões alinhadas com os seus valores, essa inclusive. Mediante o apelo, o mestre diz que entende isso mas que ele não será bom como um clérigo nessa tarefa, e que suas chances serão menores do que a de um Clérigo de 1° nível, de acordo com as regras. Além disso, um juramento deverá ser feito: caso o guerreiro passe de nível, seguirá como clérigo, e não  mais com sua antiga classe. O Jogador aceita as condições e o jogo continua.

[Arbitragem] Abaixo, segue a tabela de Expulsar Mortos-Vivos com uma coluna "extra", representando o "clérigo de nível 0" aonde o mesmo padrão de chances é replicado, porém agora numa categoria inferior a da ferramenta padrão. É apenas uma sugestão de arbitragem, para este caso específico, usando como parâmetro as chances de um clérigo mais apto.


 

 

 

 

DVs dos mortos vivos†

 

Nível

1 DV

2 DVs

3 DVs

4 DVs

5 DVs

6 DVs

7 DVs

8 DVs

9 DVs

10+ DVs*

0

9

11

1

7

9

11

2

5

7

9

11

3

3

5

7

9

11



Caso Pedro sobreviva, passará de nível como clérigo e a negociação sobre o XP necessário ficará para o final da sessão.



A título de curiosidade Pedro tira 9 no teste, consegue expulsar os mortos vivos e foge do mausoléu com vida.


Conclusão

O exemplo acima quebra a estrutura convencional das classes do jogo e acaba por "permitir" o surgimento de um personagem "multiclasse" de maneira orgânica, vindo primeiro a ficção, com o tratamento mecânico aparecendo por meio das negociações. Chegamos, assim, em uma arbitragem aceita pela mesa.

Nem todo anão alcançará a capacidade de lançar magias, nem todo guerreiro a de expulsar mortos-vivos. Além da vontade do jogador,  deve haver uma razoabilidade ficcional e um fundamento de verossimilhança para isso!


Consequências

  • Evolução como clérigo: a proposta do mestre era o personagem seguir passando de nível com o XP equivalente a partir do 3° nível de clérigo, porém com as habilidades correspondentes ao 1º nível, incluindo as magias.
  • Expulsar Mortos-Vivos: não seria uma habilidade adquirida, foi fruto de uma situação excepcional, lembrando que, caso o personagem não tivesse um histórico de alinhamento com essa divindade, ele  provavelmente não teria sucesso nessa negociação.
  • Negociação: Seria possível o jogador tentar negociar com o mestre de manter essa habilidade como um "clérigo nível 0" em troca de uma provação significativa a essa divindade, e talvez pleitear um acréscimo de XP necessário para evoluir entre os níveis como guerreiro.

  

Mesas diferentes chegarão a soluções diferentes. Isso faz parte do aspecto singular de cada grupo, graças a suas dinâmicas únicas e particulares. 


    Na próxima reflexão falaremos um pouco sobre deslocamento e encontros. 

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